Por Aibes em 02/12/2021
Efeitos práticos da emissão da guia de trânsito animal desacompanhada de nota fiscal

Por Gabriel de Lima Moraes - Advogado especialista em Direito Tributário

Um assunto que tem ganhado bastante enfoque ultimamente, tem sido a discussão sobre as reiteradas multas aplicadas a produtores rurais que emitem Guias de Trânsito Animal de gado bovino, sem, contudo, emitir a competente Nota Fiscal, gerando autos de infração de valores vultuosos por todo o Estado de Goiás.

Inicialmente, importante adentrarmos nas diferenças dos dois documentos mencionados. Em vigor desde o ano de 2006, o Decreto n° 5.741 criou no Brasil o Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária, através do qual surgiu a Guia de Trânsito Animal – GTA como documento nacional utilizado no transporte de animais.

Tal guia de trânsito possui natureza sanitária, sendo um documento utilizado pelos órgãos de fiscalização para controlar a movimentação de animais por todo território nacional, favorecendo a prevenção e diminuição de doenças infectocontagiosas.

Por outro lado, a Nota Fiscal tem sua origem datada de 1970, criada com o objetivo de lastrear a circulação de mercadorias por todo o Brasil, sendo considerada uma obrigação acessória a ser cumprida na atividade rural, independente da operação ser tributada ou não.

Em relação ao transporte de gado entre propriedades rurais, seja para cria, recria, engorda, abate ou venda, vigora no Estado de Goiás uma isenção do ICMS quando tais operações forem feitas dentro do Estado, porém, desde que haja a expedição da competente nota fiscal para acompanhar o transporte.

Nos últimos anos, muitos produtores rurais, por desconhecimento da legislação, ou por dificuldades de acesso ao local para emissão da nota fiscal, acabavam emitindo a GTA do transporte dos animais sem emitir a respectiva nota fiscal, acreditando que não teriam problemas, por ser tratar de uma operação isenta, sem cobrança de imposto estadual.

Ocorre que a fiscalização goiana optou por realizar vários trabalhos em conjunto com a AGRODEFESA, identificando tais ocorrências e lavrando os respectivos autos de infração, perdendo o contribuinte o direito à isenção, ante identificação da irregularidade documental, tendo que arcar com a cobrança do tributo, multa, juros e correção monetária.

 

Por entenderem se tratar de uma injustiça sofrida pelos produtores rurais, tendo em vista estarmos diante de um mero descumprimento de obrigação acessória de operação isenta, comumente reconhecida como ausente de tributação pelo ICMS, as Associações, Federações e Sindicatos ligados ao Agronegócio desde de 2016 iniciaram uma luta em prol dos seus representados, buscando a anistia de tais cobranças abusivas.

O pleito classista obteve apoio da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, a qual em 17/01/2020 editou a Lei n° 20.732, na qual em seu artigo 8° concedeu remissão (perdão) às dívidas tributárias e não tributárias de autuações por transporte de gado bovino desacompanhado de Nota Fiscal, mas acompanhado de GTA, ocorridas até a data de sua publicação.

Infelizmente, o mesmo apoio não veio pelo Governo do Estado de Goiás, o qual se posicionou firmemente contra à remissão dada, argumentando sobre uma grande renúncia fiscal e queda de arrecadação em época de pandemia, optando por levar a briga ao Judiciário mediante propositura de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (5256507.85.2020.8.09.0000) em 03/06/2020, pleiteando a revogação do perdão.

Além da judicialização da discussão, em 24/06/2020 foi editado pelo Governo Estadual o Decreto 9.680/2020, o qual determinava que os órgãos e entidades ligadas a este negassem aplicação à anistia concedida, o que, em suma, determinava a continuação de todos os atos necessários para cobrança dos créditos tributários.

Durante muitos meses pairou a insegurança jurídica no ar, levando a um aumento exponencial de interposição de medidas judicias por produtores rurais visando discutir a questão, até que em 27/09/2021 a ADI interposta pelo Governo Estadual foi julgada procedente (ainda cabível a interposição de recursos), declarando a inconstitucionalidade da anistia concedida através da Lei 20.732/2020.

Em que pese recaísse uma iminente derrota sobre os produtores rurais goianos, estes tiveram novamente suas necessidades ouvidas. Amplamente noticiado nos meios de comunicação, em 29/11/2021 foi promulgada pelo Presidente da ALEGO, Lissauer Vieira, a Lei 21.077, a qual alterou o Código Tributário Estadual, incluindo as operações internas de gado dentro do campo da não incidência de ICMS, alcançando ainda os créditos pretéritos.

A matéria seguia em discussão desde 2019, porém, o governo estadual vetou o texto referente à não incidência de ICMS nas operações internas com gado. Com o retorno do Projeto de Lei à ALEGO, foi possível então a derrubada do veto, prosseguindo com a promulgação da lei para sacramentar a derrubada da injustiça tributária contra os produtores rurais.

Todo o imbróglio que se formou entre o Governo de Goiás e os produtores rurais trouxe uma enorme insegurança jurídica, pairando ainda dúvidas sobre a pacificação da matéria, ou se ainda teremos novas judicializações sobre o tema. Por enquanto, fica a sugestão ao produtor rural ter cautela, sendo recomendável a emissão da respectiva Nota Fiscal, acompanhando a GTA, no transporte de gados bovinos.

Caso haja algum impedimento à emissão da competente Nota Fiscal, havendo qualquer notificação de autuação, deve-se ficar atento aos prazos para interposição das impugnações e recursos administrativos cabíveis. Esgotando a possibilidade de discussão na seara administrativa, deverá ser analisada a necessidade de interposição de medidas judiciais.

Artigo publicado pela Revista do Sindicato Rural de Rio Verde / GO - Edição dezembro/2021

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